quarta-feira, 16 de janeiro de 2013

A realidade como storyboard

Com bom desempenho em premiações, Argo explora a metalinguagem como recurso narrativo


Talvez o assunto me seja excessivamente caro, mas sempre busco observar o dilema da representação da realidade em uma obra. Isto é, quais foram as saídas escolhidas pelo autor para (a) expressar angústia diante do universo fugidio ou (b) cumprir as exigências estabelecidas pelo chefe/produtor. É nesse sentido que, para mim, começamos a falar de Argo  -- aquele filme do Ben Affleck, esnobado pela academia, enaltecido pelo bla bla bla, vencedor disso e daquilo.

O longa – meio drama, meio ação, meio espionagem –, acerta na construção da tensão: a trilha sonora eleva-se na medida certa; cortes rápidos se combinam com a câmera que, por vezes passeando pelas cenas, se comporta como uma espiã infiltrada em organização inimiga. A única personagem com uma pitada a mais de profundidade psicológica é o protagonista-herói Tony Mendez (Affleck), agente de “exfiltração” da CIA, pai angustiado que não consegue acompanhar o crescimento do filho, pois trabalha muito e cuja identidade secreta o impede de colher os louros de seus triunfos.

Parafraseando e resumindo a sinopse, Mendez é o responsável por resgatar, em 1980, cidadãos americanos confinados no Irã (o processo que depôs o xá Reza Pahlevi e instaurou o regime dos aiatolás ocorrera no ano anterior). Em plena Guerra Fria e com as forças revolucionárias iranianas controlando ruas e fronteiras, a solução encontrada pelo agente foi rodar um sci-fi falso, chamado Argo, no país, aproveitando as paisagens desérticas.

Uso a maioria dos verbos no modo indicativo porque, ora, já é sabido: a obra é baseada em fatos reais. Como contar essa história, finalmente revelada nos anos 1990, e, ao mesmo tempo, criar uma ficção de fôlego é o aspecto mais interessante da produção. Porque Affleck não escolheu o gênero documentário como opção de verossimilhança. Ele elegeu a ficção e ela, neste caso, clama por metalinguagem. Afinal, é um filme sobre uma ação em torno de um filme falso.

Não é a primeira vez -- nem será a última -- que Hollywood volta-se sobre si mesma em uma produção. Imagino que, da autocrítica definitiva feita pelo clássico Crepúsculo dos deuses (1950, dirigido por Billy Wilder), pouco deve ter mudado (e para pior). As piadas sobre o funcionamento eticamente questionável da maior indústria do cinema ficam por conta das figuras do produtor e do roteirista contratados para dissimular a mentira para a imprensa. Além disso, são várias as menções a blockbusters da época, em especial a Star Wars.

Contudo, o grande acerto de Affleck, creio, foi a exposição de seu laboratório de (re)criação. O filme começa com uma longa sequência de storyboards, acompanhados pelo off que explica os acontecimentos prévios à ação narrada. Em seguida, imagens filmadas para a produção se misturam (quase imperceptivelmente, em alguns casos) a cenas e fotografias da época. O efeito é inevitável: não há dúvidas de que a história -- ou, pelo menos, o argumento central dela -- é, sim, real. Nós, espectadores, entramos no jogo da verossimilhança, somos transportados de maneira vertiginosa para a universo do filme. Assim, os efeitos de tensão nos parecem mais latentes.

Obviamente, usar imagens da época para contar histórias com respaldo na realidade não é um recurso exclusivo de Affleck. Seu mérito está justamente em expor esse mecanismo que, como dito, nos transporta com lucidez crítica para o interior da ficção. Sabemos que estamos diante de um filme, que funciona dentro da lógica industrial. Aliás, é constante a presença do storyboard do Argo falso (e real). A realidade, em nosso Argo real, indicado ao Oscar (e também falso), é o storyboard a ser atingido, e não apenas objeto de mera reprodução. O jogo da metaficção mostra, aí, suas garras.


Fato curioso e digno de nota: é justamente vivendo Mendez, incapaz de receber honrarias, que Affleck consolidou seu nome como diretor.


Para quem quiser saber o que aconteceu mesmo e o que foi invenção do roteirista, a BBC fez uma matéria bacana sobre isso. 

quinta-feira, 25 de outubro de 2012

Nada será possível e esbarrarei contra o verbo.

sábado, 18 de agosto de 2012

Das duas

Todo mundo é importante.
E quero, queria, por favor
Ser como uma onda, uma ondinha
Surrealista.
-- ¿Y (por supuesto) que) estás lista? -- me lo preguntarían.
Dale, qué nada
Aún así me propagaría.

sexta-feira, 20 de abril de 2012

Perdendo.

domingo, 25 de março de 2012

Livra?
Livro.

Do que não me alembro
Mas que ainda alumbra

quarta-feira, 14 de março de 2012

Ando,
nasço ontem.
vivo amanhã.

Agora, a

ausência

a

aturar viva a

complacência

como forma

a resignação

sábado, 10 de março de 2012

Invenção

Dia desses surgi com a mínima: "a literatura é um suicídio às avessas".

Em outras (melhores) páginas (de fato), ler-se-ia "odradek". Mas esta não é uma metáfora que mereça uma nova palavra no dicionário.

Desde então, venho me remoendo entre as noções avessas ao suicídio e os avessos suicidas. Afinal, se suicídio é tirar-se a vida, o oposto disso é dar-se vida, certo?

Porém, entender as ideias que nos ocorrem entre uma página e outra exige mais do que a lógica dos antônimos. Simplesmente porque se pensa nisso quase num modus operandi, um contínuo palavrapalavra.

É aquela ideia que não arreda o pé da gente, mas também não quer ser compreendida. Veja só, uma frase boba, ordem direta, sujeito simples, verbo, objeto direto, adjetivo, x=y -- e, ainda assim, enigma.

Nessas horas, a linguagem nos dá um susto.

Pensemos, pois. O máximo foi uma hipótese: talvez a gente morra em uma coisa e nasça noutra, não é nem uma transcendência. Só outra coisa, diferente. Vá lá, aos simplistas: não quero dizer "puxa, como cada livro muda a gente, né?". Mas para que a literatura exista, para que sejamos autores, leitores ou decoradores de estantes, nosso próprio sujeito deve devir. Ninguém entra no jogo e sai incólume. Apenas porque, nesse jogo, o mundo é outro.