quarta-feira, 1 de setembro de 2010

Mostra “Fernando Pessoa, Plural como o Universo”



“Sê plural como o universo!”
Em cartaz no Museu da Língua Portuguesa, mostra sobre o escritor Fernando Pessoa convida os visitantes a descobrir o universo do poeta português


O elevador é um capítulo à parte na história do Museu da Língua Portuguesa. Os ocupantes são recebidos pela inconfundível voz de Arnaldo Antunes que, desde 2006, ano da viagem inaugural do envidraçado meio de transporte, embala visitantes e ascensoristas durante seus trajetos pelos três pisos do prédio.

O ex-titã recita, rouca e incansavelmente, palavras de diversos idiomas num “poema concreto de uma nota só” pouco apreciado pelos trabalhadores do ascensor. Sob a garantia de anonimato, um funcionário revelou que eles sequer podem ouvir seus próprios tocadores de música, ainda que de maneira discreta. De fato, a literatura se mostra indelével em todos os ambientes do museu.

As portas de ferro do elevador se abrem no primeiro andar e, no mesmo instante, aparece Fernando Antonino Nogueira Pessoa: “o mais brasileiro dos poetas portugueses”, segundo Carlos Felipe Moisés, um dos curadores da exposição “Fernando Pessoa, Plural como o Universo”, em cartaz no museu desde o último dia 24. A fotografia do poeta estancado ali, eterno em seu caminhar pelas ruas de Lisboa, tem um quê de mistério: não se sabe se ele vem nos cumprimentar ou se foge sorrateiro de nossas vistas, legando-nos a tarefa de descobrirmos sozinhos os caminhos de sua obra.

A disposição da mostra não poderia representar melhor a lógica (ou a falta dela) da produção de Pessoa. Não espere o visitante que encontrará um roteiro pré-definido em seu trajeto pela exposição: a vida e a literatura do autor estão dispostas tal qual um labirinto, onde versos se misturam a um sinestésico jogo de luzes e sons.

A ruptura do indivíduo moderno, característica principal da obra do “poeta fingidor”, é representada por meio da ruptura do espaço – o cenário resume-se a um grande palco por onde desfilam seus heterônimos. Os mais famosos: Alberto Caeiro, Álvaro de Campos, Bernardo Soares e Ricardo Reis.

Dentre os ambientes da exposição, destaca-se uma espécie de sala dos espelhos, que propõe, em meio ao som de versos do poeta, a descoberta dos diversos “eus” escondidos em cada reflexo do visitante.

Também impressiona a instalação destinada à poesia épica de Pessoa, a qual busca resgatar as glórias conquistadas por Portugal à época das Grandes Navegações. Para representar tal aspecto da obra do poeta, trechos dos poemas “D. Sebastião” e “Mar Portuguez” são projetados em um banco de areia, como se fossem escritos por uma mão invisível querendo lembrar, tal qual o povo lusitano, suas glórias diante do mar.

Por meio de fotografias, desenhos, reproduções de periódicos do início do século XX e de documentos raros, o visitante, mais do que descobrir a riqueza da obra de Fernando Pessoa, entra em contato com a vida do poeta que, como poucos, conseguiu representar o homem de seu (e de nosso) tempoo. Afinal, como ele mesmo explica em um de seus versos, “viver não é necessário, o que é necessário é criar”.
Imagem: Yugo Tanaka/UOL